É sempre ela: a
explicação. Achamos que cabemos no que explicamos. Ledo engano. Teorizamos a
pessoa que nunca fomos. No máximo o pálido sonho de algum dia ter sido. Frases,
gestos, entonação de voz, mil alterações de humor, tons de pele, o rosto
tentando mentir. Explicamos querendo trazer o “ex”, o “para
fora de”, para dentro.
Diante
do espelho somos outro. Aquele que olha e o que é olhado. Idealizado. Aquele
desmascarado. Ultrajado. Censurado. A tentativa de ser. As caricaturas. A dança
estranha entre verdade e mentira que fala, mas não é. Explicamos: “ser
humano é ser assim...”. Vencidos, assumimos, para nossa vergonha, que não
somos. Liberdade talvez seja isso: o inexplicável.
Somos
atores medianos. Peças aleatórias? Um pouco de ar. Não cabemos naquilo que se
explica com a arrogância típica das certezas. Deveríamos gargalhar de todos que
bradam aos quatro ventos: “eu tenho respostas!” A vida não faz
sentido nas respostas, mas nas dúvidas. É jazz. É sentir na pele. É o instante.
O pequeno êxtase que faz a alma delirar. Pobre de quem tenta explicar o
delírio.
Deixe
as pretensões pedagógicas. Solte as cordas. Desate os nós. Desça do salto.
Erre. Viva. Seja. Crie. Falhe. Deixe. Rasgue. Esqueça. Durma bem. Diga mais a
palavra “talvez”. É bom não saber de tudo. A tentação da explicação
aborta o mistério. Ouça música de qualidade. Feche mais os olhos. Mire os
emaranhados. Admire os descompassos, as pausas, as fissuras, os traços do
tempo. É o dom do efêmero.
Respire.
Pare o show. Apague a luz. Desfrute da sombra. Sinta o cheiro do seu amor. Tire
os sapatos e sinta o chão. Pela primeira vez, talvez, ande. Deixe-se embalar
pelas surpresas do cotidiano, ainda que dolorosas. Renda-se. Desafine. Cante
aquela música. “Siga o coelho branco”.
Por
favor, não tente explicar esse texto.
“O
que é já foi; o que há de ser, também já foi, e Deus investigará o passado” (Eclesiastes
3.15).
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